Angola: a liberdade de expressão é mais importante do que os diamantes
A lei relativa à denúncia caluniosa pela qual Rafael Marques vai ser julgado deve ser considerada uma violação da Constituição de Angola e das obrigações de Angola à luz do direito internacional.
Rafael Marques tem um longo historial de trabalho através do qual responsabiliza o Governo angolano, nas suas investigações jornalísticas, não só fundamentadas mas conceituadas, por violações de direitos humanos e corrupção. Rafael Marques recebeu numerosos prémios internacionais de prestígio pelo seu trabalho. É um defensor da igualdade de oportunidades no âmbito dos direitos humanos, e trabalha para expor violações, independentemente de quem as pratica. Devido ao seu trabalho, foi preso e detido várias vezes em Angola. O Comité de Direitos Humanos das Nações Unidas determinou que uma anterior condenação por difamação violava os direitos à liberdade e à segurança pessoal, liberdade de movimento e liberdade de expressão.
O livro pelo qual Rafael Marques vai a tribunal, Diamantes de Sangue, Corrupção e Tortura em Angola, faz graves acusações de flagrantes violações de direitos humanos cometidas contra residentes na região das Lundas, no decurso de escavações em minas de diamantes, nomeadamente mortes, tortura e desalojamentos forçados. Os militares, as empresas das minas de diamantes e as empresas de segurança privada envolvidas tentaram inicialmente processar Rafael Marques por difamação em Portugal, mas o caso foi arquivado. Mudaram depois de local, e avançaram com uma ação legal contra Rafael Marques em Angola.
Já ocorreram irregularidades neste processo legal contra Rafael Marques, incluindo interrogatórios sem a presença do seu representante legal, notificações e citações inapropriadas, e uma contradição de fundo: a aparente intenção do Governo de chamar Rafael Marques como testemunha, de que resultou a sua constituição como arguido e como testemunha do Estado no seu próprio julgamento.
As organizações e os indivíduos abaixo assinados mostram-se preocupados com a possibilidade de Rafael Marques não ter um julgamento justo, assim como com os repetidos esforços do Governo angolano para restringir a sua liberdade de expressão, e, ainda, de outros jornalistas e cidadãos no país. A Amnistia Internacional, a Human Rights Watch, a Media Legal Defence Initiative, o Centro de Litigação da África Austral, o Comité para a Proteção dos Jornalistas, os Repórteres sem Fronteiras, a Freedom House e muitos outros expressaram preocupações relativamente a mortes documentadas, desaparecimentos, intimidação e violência contra jornalistas e cidadãos no exercício da sua liberdade de expressão.
Instamos o sistema judicial angolano a reconhecer a decisão de dezembro de 2014 do Tribunal Africano para os Direitos Humanos e dos Povos num caso de difamação contra um jornalista no Burkina Faso, segundo a qual as penas de prisão como sanção para a difamação violam a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos e o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos. A lei relativa à denúncia caluniosa pela qual Rafael Marques vai ser julgado deve ser considerada uma violação da Constituição de Angola e das obrigações de Angola à luz do direito internacional.
Signatários:
Amnistia Internacional – Deprose Muchena, Diretor para a África Austral
Amnistia Internacional Portugal – Teresa Pina, Diretora Executiva
Amnistia Internacional EUA – Steven Hawkins, Diretor Executivo
Anistia Internacional Brasil – Átila Roque, Diretor Executivo
Transparency International – Cobus de Swardt, Diretor Geral
Transparência e Integridade, Associação Cívica - João Paulo Batalha, Diretor Executivo
Iniciativa de Defesa Legal dos Media – Peter Noorlander, Diretor Executivo
Centro de Litigação da África Austral – Kaajal Ramjathan-Keogh, Diretor Executivo
Repórteres Sem Fronteiras – Christophe Deloire, Secretário-Geral
Comité para a Proteção dos Jornalistas – Susan Valentine, Coordenadora do Programa de África
Global Witness – Simon Tayor, Diretor
Freedom House – Mark Lagon, Presidente
Front Line Defenders – Mary Lawlor, Diretora Executiva
PEN American Center – Suzanne Nossel, Diretora Executiva
Newseum – Peter S. Prichard, Diretor Executivo e Presidente
Associação Mundial de Jornais e Editores de Notícias – Alison Meston, Diretora de Campanhas Globais
Centro Robert F. Kennedy para a Justiça e Direitos Humanos – Jeffrey Smith, Responsável por Advocacy
Associação Justiça Paz e Democracia – Maria Lúcia da Silveira, Presidente
Open Society Foundation Angola – Elias Isaac, Diretor Nacional
Comissão Internacional de Juristas – Arnold Tsunga, Diretor do Programa África
Projeto de Defensores dos Direitos Humanos no Oriente e no Corno de África – Hassan Shire, Diretor Executivo
Rede Pan-Africana de Defensores de Direitos Humanos – Hassan Shire, Presidente
ARTICLE 19 – Henry Omusundi Maina, Diretor Regional para a África Ocidental
Advogados do Zimbabwe para os Direitos Humanos – Irene Petras, Diretora
Instituto para os Direitos Humanos e Desenvolvimento em África – Gaye Sowe, Diretor de Programas
Instituto de Direitos Humanos da África do Sul – Corlett Letlojane, Diretora Executiva
Ação dos Cristãos para a Abolição da Tortura – Jean-Etienne de Linares, Diretor Executivo
OMUNGA – José Patrocínio, Coordenador Geral
União dos Advogados Pan-Africanos – Donald Deya, Diretor Executivo
Federação Internacional dos Direitos Humanos – Tchérina Jerolon, Vice-Diretora do Departamento Africano
DITSWANELO – Alice Mogwe, Diretora Executiva
Fundação para as Iniciativas de Direitos Humanos – Sheila Nabachwa, Diretora Executiva
Equal Rights Trust – Dimitrina Petrova, Diretora Executiva
WLSA Moçambique – Calista Terezinha da Silva, Coordenadora Nacional
Associação de Advogados da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral-SADC – Gilberto Caldeira Correia, Presidente